27 de janeiro de 2011

Não ganho nada... Ai se ganhasse!

Convidar você diretamente e algumas pessoas que supostamente estão em Salvador, não custa nada.
É no Parque da Cidade, ali no Itaigara que a banda Móveis Coloniais de Acaju, de Brasília, estará tocando de graça.
Boa banda!
Chamei umas 100 pessoas.
Aparecendo os quatro da família já é comum e maravilha.
Todos ou alguns!
Tá de bom tamanho e que beleza...
Você veio!
Massa!
Não acreditôôô!


O parque é tranquilo, dado que o bom papo com os colegas, para não dizer que a amizade é só de orkut, rs, é uma boa viagem pelas alegrias das partes.


Então domingo, dia 30/01/2011, 11h, estaremos lá e depois, ou volta pra casa, ou vai prestigiar a banda quase de Cipó, Confraria Giramundo lá na Praia do Flamengo ou vai ao Pelô prestigiar Maglore e Cascadura com Sanguinho Novo e Veroz.
É um caminho e depois... Duas Veredas... escolha a sua e estamos esperando nos arvoredos do Parque.
É tudo de graça.
Só se gasta com combú ou buzú e o que consumir por lá.

Na segunda, postaremos fotos e comentários...
 
Abraços!

ESTÁ MAIS PRA VINICIUS, CAMUS, HELEN OU SEILÁ?



Dialética
É claro que a vida é boa
É claro que te acho elegante
É claro que te amo
E tenho tudo para ser feliz
Mas acontece que sou triste... (Vinicius de Moraes)

Amar é...
sorrir por nada e ficar triste sem motivos
é
sentir-se só no meio da multidão,
é o ciúme sem sentido,
o desejo de um
carinho;
é passear com a
felicidade. (Alberto Camus)

Quando uma porta da felicidade se fecha,
outra se abre,
mas
costumamos ficar
olhando tanto tempo
para a que se fechou
que não
vemos a que se abriu. (Helen Keller)

Hunrrum! (Seilá)

23 de janeiro de 2011

UM POUCO DE GUIMARÃES ROSA EM CALDAS DE CIPÓ


UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
Colóquio de Pós-Graduação de Ciência da Literatura
12 e 13 de novembro de 2003

O INTELECTUAL NAS VEREDAS DA ORALIDADE

Cléa Corrêa de Mello (Doutoranda em Literatura Comparada)


Resumo Mapeamento dos circuitos semânticos que configuram Guimarães Rosa como intelectual público. Estudo das declarações e interferências do escritor na cena político-cultural e análise da contínua distensão quanto a expectativas de engajamento mais explícito.
Palavras chave Guimarães Rosa, intelectual, engajamento



Entre as raras entrevistas de Guimarães Rosa, a de 1965, concedida em Gênova a Günter Lorenz, por ocasião do Congresso de Escritores Latino-Americanos, é uma das escassas oportunidades, fora do espectro ficcional, para que os estudiosos de sua obra sejam confrontados com reflexões e conceitos do ficcionista a respeito dos vínculos entre literatura e engajamento ou, ainda, sobre o papel do intelectual. Na ocasião, Lorenz inicia o diálogo inquirindo-o, justamente, sobre o provável desinteresse quanto ao tema político:

Ontem, quando escritores participantes deste Congresso debatiam sobre a política em geral e o compromisso político do escritor, você, João Guimarães Rosa, político, diplomata e escritor brasileiro, abandonou a sala. Embora sua saída não tenha sido demonstrativa, pela expressão de seu rosto e pelas observações que fez, podia-se deduzir que o tema em questão não era de seu agrado. (ROSA, Apud COUTINHO, 1983, p. 62-63)

Tentando esclarecer um ponto de vista que aponta para as irredutibilidades entre o espaço da política stricto sensu e a esfera do intelectual crítico, tanto quanto para a necessidade de assunção de responsabilidades de cunho humanístico, Rosa replica, demonstrando, nesta e em outras etapas da conversa, a consistência do seu desafio ao conceito de engajamento então predominante entre os produtores literários:
Embora eu veja o escritor como um homem que assume uma grande responsabilidade, creio entretanto, que não deveria se ocupar de política; não desta forma de política. Sua missão é muito mais importante: é o próprio homem. (Ibidem, p. 62-63)

Portanto, Rosa enunciava, com clareza, a consciência de que sua opinião destoava do pensamento hegemônico, e divergia da conjuntura que tendia a privilegiar, ou, pelo menos, a conferir maior visibilidade aos artistas atuantes: aqueles que demonstravam prontidão para emitir juízos de caráter geral e para intervir em debates sócio-políticos, fora da arena de suas práticas expressivas. Simultaneamente refutando o papel de político que lhe imputara Lorenz e descrevendo-se como escritor comprometido com fundamentos humanistas, o autor de Corpo de baile expressa com veemência suas incompatibilidades com o âmbito da política, na qual verifica charlatanices e desumanidades.
Mais adiante no colóquio com Günter Lorenz, Rosa comenta suas identidades. Algumas óbvias, como as de escritor e diplomata, além de outra, a de vaqueiro, que parece se coadunar com o empenho na construção da imagem pública de escritor afeito ao universo narrado. Neste sentido, considerar-se vaqueiro implica agregar, aos textos literários, um teor de legitimidade, porquanto a experiência de vida do autor conferiria modulação autêntica ao universo narrado. Ou seja, os leitores estariam diante de material ficcional sim, porém chancelado pelo critério de autoridade acionado, intermitentemente, pelo próprio escritor que propala, através dos poucos depoimentos, da farta correspondência, e de sugestivo material iconográfico, a condição com a qual se identifica: a de vaqueiro sertanejo.
Diante disso, tanto quanto as parcas entrevistas, também o ensaio fotográfico de autoria de Eugênio Silva, para a reportagem publicada na revista O Cruzeiro, em 21 de junho de 1952, mostrando Guimarães Rosa em pleno sertão - selando a montaria, cavalgando, bebendo de coité, acendendo cigarro de palha com a brasa de uma fogueira, ou envergando casaco e chapéu de couro - colabora para que se forjem constelações de semiologias relativas ao mundo sertanejo importantes no estabelecimento dos vetores de padrão receptivo da sua escritura. Estas referências seriam responsáveis por encaminhar o trânsito de sentidos entre obra e público, e confluiriam para produzir a sintonia autor/matéria narrada, e para neutralizar interpretações desvinculadas da abordagem empática, pelo escritor, do universo que informa sua literatura.
Como resultante, em mais de uma oportunidade, os agentes literários se mostraram sensíveis ao apelo e ao potencial de veiculação da imagem pública de um ficcionista que se desdobra, com segurança, no seu duplo: o vaqueiro. Deste modo, e, talvez, avaliando como oportuno para o mercado europeu, divulgar a obra de Guimarães Rosa como a de um escritor que representa esteticamente uma realidade na qual viveu/vivia (e aí a ambigüidade seria capitalizada pela empresa), a editora italiana Feltrinelli escolhe como capa para a versão de Corpo di ballo, de 1964, uma das fotos de Eugênio Silva, onde Rosa aparece a cavalo, conduzindo um rebanho pela extensa paisagem que se prolonga a sua frente.
É como se, prontamente, fossem estabelecidos os termos do pacto de leitura sob o qual é garantido ao receptor estrangeiro um produto genuíno. A intimidade do artista com a mundividência sertaneja abona a fatura literária, afastando o temor da contrafação. Trata-se, pois, curiosa e paradoxalmente, de matéria ficcional sendo vendida com o respaldo máximo e a propaganda do vínculo estreito e atestável com a realidade. O propósito deliberado do escritor de colaborar de forma operosa na plena divulgação de seus textos além de demonstrar a precariedade e amadorismo do processo editorial brasileiro (a esta altura dependente em larga escala de que o próprio autor se responsabilizasse pela ativação de vínculos sociais indispensáveis para melhor difundir sua literatura), evidencia, o esforço consciente de Rosa, devotado ao reconhecimento e valorização da obra que produzia. É assim que encontramos, numa carta, datada de 17 de janeiro de 1946, expressões consumadas da diligência rosiana em promover Sagarana. Chama a atenção, inclusive, o meticulosa sensibilidade quanto ao planejamento do timing publicitário:

A turma daqui já está fichada; até agora, impedi, ferozmente, qualquer publicidade, para reservar todas as baterias à campanha de surpresa, depois do livro na rua. Barulhada prévia, seria contraproducente, cheirando a propaganda encomendada. Por isso recusei até entrevistas grandes, com fotografia /.../. (ROSA, Apud GUIMARÃES, 1972, p. 127)

De fato, estas e outras situações são exemplares quando se trata de estimar as repercussões das estratégias de gestão de Guimarães Rosa sobre a sua obra. E, afora o eficiente trabalho de bastidores, também alguns acontecimentos públicos reiteram a disciplinada aplicação do autor. De tal maneira que, no ano de 1952, Rosa é convidado por Assis Chateaubriand para, na condição de líder de vaqueiros, receber o Presidente Getúlio Vargas num gigantesco encontro de “encourados”, o que vinha a atestar o sucesso do projeto deliberado de aderir à imagem de escritor a figura do vaqueiro.
Analisar a dinâmica de negociações culturais ativadas nesta festividade significa reconhecer, de pronto, que Estado e imprensa avalizam o desempenho do diplomata/vaqueiro/escritor tanto quanto este(s) ajuda(m) aqueles poderes a reencenarem uma funcional coreografia apaziguadora que remeteria à contigüidade amistosa (desde que os vaqueiros se deixem comandar e abstraiam o fato e os motivos de não serem proprietários de terras) entre o campo intelectual e a vivência do trabalhador do sertão. Observemos a carta de Rosa ao pai, Florduardo, relatando o inusitado evento:

Em Caldas-do-Cipó, pude ver reunidos – espetáculo inédito, nos anais sertanejos e creio mesmo que em qualquer parte – cerca de 600 vaqueiros autênticos dos “encourados”: chapéu, guarda-peito, jaleco, gibão, calças, polainas, tudo de couro, couro de veado mateiro, cor de suçuarana. /.../ Fui com Assis Chateaubriand, que é o rei do (sic) entusiastas, e tive de vestir também o uniforme de couro e montar a cavalo (num esplêndido cavalo paraibano), formando na “guarda vaqueira” que foi ao campo de aviação receber o Presidente Getúlio Vargas. A mim coube “comandar” os vaqueiros de Soure e de Cipó (!). (ROSA, 1983, p. 171-173)

Se, para um Governo comprometido com o figurino nacionalista e às voltas com práticas demagógicas e com os rescaldos da agenda autoritária interessava dispor de um intelectual, expondo-o confortável no triplo papel de escritor, vaqueiro e funcionário da chancelaria, para Rosa, o espetáculo, que vem a ser cooptado pela imprensa e pelo Estado, representa outra importante instância de reconhecimento e de publicidade da sua produção no mundo das letras, tanto quanto os juízos positivos de renomados críticos, ou o considerável número de edições que Sagarana porventura viesse tendo.
Segundo a lógica deste mercado de bens simbólicos, o artista colabora produzindo uma arte, uma interferência no circuito cultural que, de acordo com a engenharia política, permite à nação conhecer-se, estreitando as relações entre o povo, tal qual o “teatro com vaqueiros” permitiu encenar. Performances, como a que Guimarães Rosa relata ao pai, para onde acorreram vaqueiros de vários Estados, reativam e atualizam séries de tradições inventadas, fundamentais no engendramento da comunidade nacional: o interior como matriz da cultura; a bravura do povo sertanejo; a cordialidade neutralizadora da potência reativa de uma população explorada.
O expediente da estetização da política identifica-se com o desígnio de representar a nação como algo imanente, onde determinadas características são tomadas enquanto atributos eternos, invulneráveis aos parâmetros contextuais. O fluxo destas narrativas performatizadas reelabora, continuamente, um patrimônio cultural intangível - dado o caráter evanescente do suporte - e voltado para edificar uma “comunidade imaginada” onde se implantam e se ratificam os discursos de conciliação nacional e da História como progresso civilizatório.
Logo, justo no momento em que o país expulsa com mais vigor os pobres do campo, em que recrudesce o processo de inchamento das cidades, em que os meios de comunicação de massa assimilam como pejo folclorizante a cultura sertaneja ou, ainda, em que os postulados políticos e as utopias de nacionalidade voltam-se para consolidar uma cultura homogênea e orgânica, um evento como este sinaliza, nos seus interstícios, a inteligibilidade, as fraturas e as demandas do imaginário da nação.
Ademais, a multiplicidade de atores sociais envolvidos (vaqueiros, jornalistas, chefe de Estado, intelectual), bem como o descompasso, o gigantismo e antinômico dos elementos cênicos (600 vaqueiros paramentados se deslocando a cavalo, para esperar o Presidente que chega de avião) fazem ressoar o travo extemporâneo e “pré-fabricado” da cerimônia em curso. Afinal, festa ou réquiem? A diversidade de propósitos que, contraditoriamente, fora capaz de reunir diferentes elementos do espectro social seria capaz de injetar estenia na verdadeira exumação de traços culturais ali em curso? Estas deveriam ser as perguntas a rondar as cabeças dos agentes responsáveis pela (re)construção da imagem do homem sertanejo, naquelas coordenadas espaço-temporais, como igualmente o foram outros representantes com função similar, ao longo dos três últimos séculos.
Em 1952, a atribulada história de parceria do Estado, da intelectualidade, da imprensa e do trabalhador rural, na modelagem das configurações do sertão e de seus habitantes, parece chegar, como o encontro de Caldas-do-Cipó o acusa, a uma encruzilhada. Sintomaticamente, até certo ponto, o fato de que a última atividade prevista - a vaquejada - tenha sido malsucedida condensa os augúrios dos novos tempos. Naquele momento, tanto quanto tentar reunir o gado tresmalhado, é preciso campear os rastros das promessas malogradas de uma modernidade. Pois, neste teatro a céu aberto, o fracasso do grand finale acaba por aludir às incômodas derivas que fundamentam a identidade nacional. Observemos o lamento de Rosa:

A vaquejada propriamente dita é que perdeu um pouco, porque o gado que estava apartado estourou durante a noite, e poucas reses puderam ser recuperadas; a maior parte delas escapou para muito longe, caíram no mundo, e, apesar de rastreadas por duas léguas, não puderam ser apanhadas. (Ibidem, p. 173)

Com efeito, vimos testemunhando nas duas últimas décadas, tanto nas reverberações da imagem pública do escritor Guimarães Rosa, como na sua fortuna crítica uma distensão na abordagem do aspecto político que se faz acompanhar por um zelo no resgate das suas respostas estéticas aos desafios históricos do seu país. Daí porque, pari passu à desqualificação do postulado do intelectual salvacionista, instala-se uma conjuntura propícia ao estímulo de análises da narrativa rosiana, que levem em conta as mediações da arte com a história, em termos que transcendam a simplificação excessiva com as quais a sua obra teve que se confrontar. E, como conseqüência, poderíamos constatar, na fortuna crítica de Guimarães Rosa, o incremento de uma dinâmica onde as perspectivas canônicas, até aqui concentradas tanto na valorização de um conceito de nacionalismo literário, mesquinhamente concebido, como na ênfase sobre o experimentalismo, e ainda no destaque das sugestões filosóficas e metafísicas, passa a dividir o perímetro interpretativo com exegeses que priorizam o potencial questionador do texto rosiano.
Deste modo, irrompem o cenário crítico interpretações que evidenciam a profunda solidariedade da sua escritura com as questões de ordem contextual - a vida numa determinada região do país - através de aspectos ficcionais que, longe do anseio de, necessariamente, ter de explicar ou de dar uma resposta, mostram, pela organização e pelo tratamento literário de seus elementos, a complexidade do que abordam.
As nuanças desta problemática se articulam, dialeticamente, através da sondagem extensa e intensa do material lingüístico disponível, o que permite ao leitor perceber as soluções de que se vale a narrativa para relativizar e complexificar a percepção do real. E, se num primeiro momento sua obra é identificada como um retrato - e como tal seguramente estático – da nação, descortinam-se, a partir de outras vertentes, oportunidades para que seja lida uma história alternativa, repleta de percalços, de contradições e de impasses.









BIBLIOGRAFIA GERAL
ANDERSON, Benedict. Imagined Communities: Reflexions on the Origin and Spread of Nationalism. London & New York: Routledge, 1996.

BHABHA, HOMI K. (Ed.) Nation and Narration. London & New York: Routledge, 1995.

DENIS, Benoît. Literatura e engajamento: de Pascal a Sartre. Trad. Luiz Aguirra Roncari. Bauru: EDUSC, 2002.

HALL, Stuart. “Cultural Identity and Diaspora”. In: WILLIAMS, Patrick & CHRISMAN, Laura. Colonial Discourse and Post-Colonial Theory (a Reader). New York: Columbia University Press, 1994, p. 392-403.

MELLO, Cléa Corrêa de. “O desafio dos Estudos Culturais”. In: Anais do VI Congresso Abralic (em CD-ROM) Literatura Comparada = Estudos Culturais? Santa Catarina: NELIC, 1999.

MICELI, Sérgio. Intelectuais e classe dirigente no Brasil (1920-1945). São Paulo: Difel, 1979.

PÉCAUT, Daniel. Os intelectuais e a política no Brasil: entre o povo e a nação. Trad. Maria Júlia Goldwasser. São Paulo: Editora Ática, 1990.

SAID. Edward W. Representations of the Intellectual. New York: Random House, 1996.




BIBLIOGRAFIA ESPECÍFICA
COUTINHO, Eduardo F. (Org.) Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira/INL, 1983(b). Coleção Fortuna Crítica, vol. 6.

GUIMARÃES, Vicente. Joãozito: infância de João Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: José Olympio, 1972.

LIMA, Deise Dantas. Encenações do Brasil rural, em Corpo de baile, de Guimarães Rosa. Niterói: EDUFF/ANPPOLL, 2001.

MELLO, Cléa Corrêa de. Guimarães Rosa, um intérprete do Brasil. Rio de Janeiro: UFRJ, 2000.(dissertação de mestrado em Literatura Comparada).

______. “A construção discursiva do nacional em Guimarães Rosa”. In: Veredas de Rosa (Seminário Internacional Guimarães Rosa - 1998). Belo Horizonte: PUCMINAS, CESPUC, 2000. p. 153-157.

ROSA, João Guimarães. Correspondência com o tradutor italiano (Edoardo Bizzarri). São Paulo: Instituto Cultural Ítalo-Brasileiro, 1972.

______. Ficção completa. 2 vols. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994.

ROSA, Vilma Guimarães. Relembramentos: João Guimarães Rosa, meu pai. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1983.

21 de janeiro de 2011

Noure comenta:

AQUI O ESPAÇO É PRA ALEGRIA E TEMOS QUE SER ASSIM, mas...
Gastaremos cinco minutos de nosso tempo, bem menos que 10% do tempo de BBB...

Nem sei se cabe neste espaço, dado que nas leituras, a palavra morte em muito se repete nos cenários da Literatura Russa. Seja em Gorki, Dostoiévski ou Tolstoi.
Este último, além de Anna Karenina e Guerra e Paz, uma obra clássica é A MORTE DE IVAN ILITCH.



A novela inicia-se com a notícia da morte de Ivan Ilitch, um alto burocrata do Palácio da Justiça de São Petersburgo.
Ao receberem a nota do óbito, seus amigos e colegas de trabalho, não se sentem tristes, mas imediatamente calculam suas chances de ascensão nos cargos. (lembra ACM)


Depois disso volta e mostra como Ivan Ilitch conhece a sua esposa. Depois de conseguir uma oferta para ser juiz em uma outra cidade, compra um apartamento lá, nesta cidade, para ele, sua mulher, sua filha e seu filho morarem. Ele vai antes e começa a decorar o apartamento do jeito que lhe agrada. Quando está decorando o apartamento, cai e, é ai que toda a sua doença começa.


Acha que em sua casa vive uma mentira: sua família o esconde dos amigos. Para ele é só agradável ficar com o filho de apenas 14 anos e com um criado mudo, porque esses não mentem para ele. Em parte Ivan Ilitch quer morrer, porque se ele morrer será o término da sua dor e também, não teria mais que morar nessa mentira toda que ele estava vivendo em sua casa.


Quando está prestes a morrer, ele já sabe e se despede da família.



Pois é...
Se não desejar a Literatura Russa que gosto muito, faça opção por São Bernardo de Graciliano Ramos, que é genuinamente brasileira.



A LEITURA É IMPORTANTE PARA A EXPRESSÃO ESCRITA.

20 de janeiro de 2011

Lá vem Noure Um

VEJAM BEM!

Um pedaço de letra de música traduzida para criança ouvir em algum lugar do planeta..

Boa noite, linda menina, durma bem.
Sonhos doces venham para você,
Sonhos doces por toda noite"...

AGORA VEJAM!
Estas misturas de músicas que as crianças ouviam e o que mais ouvem:

19 de janeiro de 2011

A IMAGEM INTERNA...


Uma das minhas grandes paixões, ainda é o Radium Hotel de Caldas de Cipó, 240 km de salvador e, o que está ou estava lá dentro.
Na parte do hotel, cada azulejo português, a linda estátua, os talheres, o piano, enfim, o ambiente todo modernista, estilo art déco, é uma parte da cultura cipoense que é alheia, inclusive aos estudantes da região, que muito necessita de temas para artigos, monografias e afins...
Não imaginam quantos na hora do sufoco, me procuram ou ao professor Evandro, para falar de Cipó. Este, dos tempos clássicos do Cassino, Radium Hotel, Getúlio Vargas, banhistas e, em mim, a procura por fatos antecedentes a este período, nas raízes afrodescendentes das áreas ribeirinhas do Itapicuru, bem como o próprio tempo e, em linhas gerais, a história do município, como um todo.
Falar em cassino, após a tristeza da Família Salles ter deixado a cidade que praticamente foi um presente dela, que ainda através de mim, deu o terreno ao lado do Grande Hotel à prefeitura para a construção da Casa da Cultura Genésio Salles.
De tudo, foi aproveitado apenas a movimentação da época do Cine Leone que, nos períodos fora de amostras de filmes, servia como bar e o grande snooker, lindos quadros e o salão encerado, ainda se podia passar, entrar, tomar o refrigerante crush e viver cada ponto de cultura, ali existente.
Também, hei de se falar que, segundo os mais velhos e, acho que é lenda, duas estátuas que se encontravam ao lado, seriam de moças xingadoras dos pais. São apenas lindas estátuas no estilo antropozoomórfico e uma terceira em homenagem ao primeiro automóvel que este em Cipó, servindo de "santo casamenteiro".

Também dizem que antes do Radium Hotel, tinha uma igreja e que lá, um boi entrou e encheu de sangue e, as coisas do município, envolvendo política, religião, artes e afins, só melhorariam quando o Rio Itapicuru enchesse e chegasse ao local do sangue do pobre boi.
Foi assim mesmo? Do jeito que está o rio... Coitado!

O pior de tudo é que entra ano e sai ano e o Radium Hotel já está nascendo árvores em suas paredes, não precisando de profecia para anunciar que em pouco tempo, infelizmente, estará uma placa por lá: "Vende-se este lote... Sem entulhos!"


"Caldas de Cipó de fato, ou Cipó de direito, é bonita de qualquer forma, porque tem seu próprio jeito." (Nourius)

17 de janeiro de 2011

Músicas Estrangeiras???

AQUELAS MÚSICAS! MESMO SEM ENTENDER, VIAJAVA PELOS CORAÇÕES!


ESTAS MÚSICAS! ENTENDENDO, A CARNE É O OLHAR NECESSÁRIO.

Acreditem!
Quem baixar no youtube músicas de Marx Davis (Fábio Junior), Christian (Zé Pereira), Christian Burgh (Jessé), Steve Maclean (Hélio Manso), Trepidants, Pholhas e afins... Poderá ver algo em comum: TODOS SÃO BRASILEIROS NATO!

Frutos de uma época que as rádios só tocavam música estrangeira. Wilson Aragão até colocou em sua Guerra de Facão: "...Tocam musgas istrangêras, invez de apruveitchar o qué da gente do nordeste, vou chamar de mintiroso, quem? dizer que é cabra da peste..."

Mas, era assim mesmo. E sem vergonha de falar. Ouça que maravilha as canções dos Pholhas, de Christian e uma prova disso é o vídeo que estou enviando abaixo: TREPIDANTS. É do nosso vizinho estado de Pernambuco. Já tocou em meu interior... Caldas de Cipó.
Quem fazia festas nesta época, era Arildo, Gilberto, Kulu e Cia.

Quando o Trepidants começou a tocar no Grill Bar, ali onde hoje funciona a Secretaria da Fazenda e os jovens ficam até altas horas brincando de... Tocar violão.
Sim!
Quando começou a tocar, soltou pela primeira vez aquele gelo seco pelo salão e muita gente pensou que era incêndio no expandir da fumaça.
Uma senhora que sei o nome disse: Corre Pepepé, a filha, que é o fim do mundo. Vamos morrer agora.

O bom de tudo, foi que Trepidants foi show de música e, eu ainda menino, com mais dois colegas, entramos por um buraco do terceiro andar do hotel, que já sairia no local da festa e por ser de menor idade, não deu outra: Seu Martins, vendedor de pastel, avisara ao vigia, Domingão, imagine pelo nome, que terminou por fazer a gente aprisionado pelo colarinho e devolver pela porta principal do Grill Bar, ouvindo de longe, o que desejava sentir de perto: a canção Remember me.
O inglês, que segundo os cantores desta época, pegavam tipo como a gente faz hoje no Google Tradutor, frases em revistas intituladas, aprenda inglês em uma década e, de frase em frase colavam as partes, originando uma bela canção.

Prestigiem nossos pernambucanos: Trepidants.

Eu era Sétima Série no Maria Vestina e entrava na sala cantando: aiamiouari iou ari toubi. tantantantan... rs
 

16 de janeiro de 2011

O HOMEM QUE COPIAVA...

"Fico na estrada pisando a lembrança de tanta vivência
Sentindo a ausência dos meus companheiros
Que em tempo passados, pisaram
na estrada e até
nunca mais."
Wilson Aragão

Tivemos o privilégio de malinar nos escritos de Wilson Aragão, arquivados em todos os campos da estante que mandara fazer no passado, tão mais perfeita que sua música feita de Massaranduba, com Raimundo Sodré ou do Pau de Atiradeira, que tomara emprestado de Paulo Matricó para encaixar na Beira Mar, na parte do "Eu e Zé de Badogue...".


Um cantor compositor que no silêncio de um dia, matutando a boa reflexão, termina por colocar em um papel, seja guardanapo, caderneta, higiênico, enfim, o que no momento estiver ao seu alcance. Os bolsos de suas bermudas justificam a essência intelectual dos papéis guardados por onde passa.
Neste malinar, sutilmente retiramos de todos os livros alguns escritos que Aragão nem mais lembrava da existência.
Pois bem... Aproveitamos o ensejo e com os objetos, ora produzidos por ele e Mirian, ora adquiridos nas viagens de shows, departamentizamos pelos caracteres comuns.
Mesmo Mirian falando que as consequências das inquietações do mesmo, sobraria para ela ao sairmos, deixei o amigo Tim, filho mais velho, a pastorar seus inquietos passos e o olhar para a estante. Veja o relatório parcial feito por Tim em forma de scrap:

São passos curtos.... serenos... às vezes, como um índio na cidade grande, vendo passar o monstro chamado carro, uma mistura de medo e curiosidade, e de certo, um desejo de deixar tudo arrumado como está, com isto, a evitância de mexer em algo, como quem simplesmente está conformado com a nova ideia, tipo aquele carro que se compra pra satisfazer as necessidades da familia, mas não a sua...
Assim tem sido os passos de Aragão diante da sua nova estante...rs (Tim).

15 de janeiro de 2011

TANTANRÃN...CHÁ, CHÁ...

Esta eu tirei do baú!
Pense numa época que não existia muita boutique e, Dire Straits, Hernandez, Sidney Magal e outros, faziam sucessos...
Mãe costurava e sempre fazia roupas às pressas e na incumbência de fazer uma camisa estilo cigano, já com sono, lá pelas 23 horas, ufa, terminou!
Pude vestir rapidamente e fui a festa, onde a dança era exatamente de acordo com este clip abaixo.
Nas dançadas e empolgado, a colega no embalo do dancing, quando pegou em meu braço e puxou pela manga da camisa, não deu outra: meu braço ficou e a manga foi.

Não fiquei zangado por mãe apenas ter alinhavado, mas, no embalo da dança e empolgado, curtir a dança e aos poucos fui saindo e indo embora, como tipo a carruagem se transformasse em abóbora.
É cada uma...
Curta um pouco este bom embalo.

14 de janeiro de 2011

Zé da Rua

Taí...


Zé da Rua não envelhece nunca...

Eu era menino e na condição de vendedor de geladinho, cocada e bananas, estas com o amigo Maneca de Dona Adalgisa, via Zé da Rua brincando, ora de frescobol com Tampinha, hippie fruto de Woodstock em Cipó ou conversando com Amigo da Onça, revolucionário que usou a primeira sunga estilo Fernando Gabeira no interior e, Cipó, morador do Radium Hotel que tinha a paciência de Cipó, a tranquilidade e o vazio eterno da praça, bom para a leitura e, hoje nem se pode dizer assim...

Ainda lembro que a ansiedade das enchentes do rio Itapicuru, estava com a vinda da seca e, em qual lugar surgiria uma nova praia.
E por presente de Deus, a nova praia teria surgido entre o Balneário e a ponte, atrás do Grande Hotel e ficava entupida de gente. Durante o carnaval, mais ainda.

Além dos moradores que estavam na moda (os parentes de Seu Tonho Cuíca e João Bonito que vinham do Rio de Janeiro para este fabuloso banho no Itapicuru), sabe quem estava lá: Zé da Rua, correndo como ninguém nos babinhas de praia.

Também na década de 80, tinha babinha de dois na pérgola, mesmo palco das manifestações culturais do Odara, grupo que fui presidente e revolucionou a cultura local. Lá estava Zé da Rua como um dos formadores da dupla.

Hoje, numa fotografia com Zé da Rua, vejo a mesma imagem de tempos atrás, ainda ganhando para o sogro de meu irmão Bada, Joãozinho retratista, que também não envelhece nunca e, tendo até outro apelido: João Ligeirinho.

E, acredito que Zé da Rua, vai ser um dos poucos cipoenses a se aposentar pela prefeitura, dado que entra governo, sai governo e, lá está Zé da Rua, como bom profissional que é, responsável pela limpeza do parque de águas thermo-medicinais de Cipó.

Quando eu estava secretário, pude defender a permanência de Zé da Rua no cargo, pelo bom histórico que tinha e que o nome Zé da Rua, era exatamente em função de não gostar de ficar em sua casa, mas, pelas ruas, distribuindo energias e olhe que na época não existiam pilhas Duracell e sim amarelinhas que se esgotavam logo, logo e Zé era altamente alcalinizado.

12 de janeiro de 2011

Wilson e Mirian


Não!


Eu não vou praticar leitura da casa, até porque cada um tem seu canto de descanso e precisa da boa privacidade no dia a dia.



Não obstante, passar um dia nas freguesias de Mirian Aragão, não traduz simplesmente, um resumo de Capim Guiné, Guerra de Facão, ou porque Raul Seixas, Sodré, Fábio Paes, Rose, Versinho e, outros tantos poetas e, poesias de autoria com origem neste lar, do compadre Wilson Aragão e algumas vezes em parceria com a esposa em coro: "Chove Inconsequente", mas, a identidade de Mirian Correia com as artes simples, ora de material reciclável, ora da mistura de objetos que fazem a gente viajar pelo sertão imaginário e o Belle Époque, com referencial no gramofone postado sobre a estante e que toca Emilinha Borba em disco vinil com quase meio quilo de peso.



O apartamento é como se fosse um ambiente de exposição permanente. Às vezes, transforma-se em expovenda, não só da produção de pinturas em discos vinil e CD's imprestáveis para uso musical, mas, de camisas com pinturas criativas que me fizeram de adepto a este estilo, por ser barata, a camisa, e, um ingrediente a mais, onde as pessoas deixam de me olhar como um todo, graças, e observam apenas o conteúdo da camisa, principalmente as produzidas com uma rede intitulada: rede dos sonhos.
Pronto!
Estava assistindo a uma peça: Pavão Misterioso" lá na Casa do Comércio e, um grupo solicitou tirar uma foto comigo, em função da referida rede e, logo, logo, procurou a origem da camisa, para comprar de igual maneira.



Cada quadro pintado, cada cabaça transformada em baiana, discos em lapinha, cortinas e arranjos, fazem do apartamento, um referencial de expoartes permanente e, que nem é possível assistir televisão ou usar o PC, num local como este, diferente de muitos onde a gente senta e dizem:
- Pere um pouco que é o final da novela.
 


10 de janeiro de 2011

Fragmentos de uma entrevista de Wilson Aragão

ENTREVISTA Autor de“Capim-Guiné”, música que se tornou famosa na voz de Raul Seixas, vive em assentamento do MST, em Santo Amaro, na Bahia

Paulo A. Magalhães, Paulo A. Magalhães Fº e Vagner Carneiro
de Salvador (BA).
ARTISTA IDEALISTA, pedagogo e engajado na luta do povo, o sem-terra Wilson Aragão é natural de Piritiba, mas morou muito tempo na roça, em Mira Serra e Morro do Chapéu. É filho de um pedreiro negro com uma professora primária, descendente de portugueses, e neto de uma cabocla da mata, que “foi pega no laço pra casar com seu avô”, como ele diz. Lúdico e imprevisível, conciliou, por um período de sua vida, a arte com a burocracia, ao trabalhar no setor de recursos humanos de grandes empresas em São Paulo e no Pólo Petroquímico de Camaçari, sem permanecer por mais de dois anos em cada. Militou no movimento sindical ao lado do governador do Estado, Jacques Wagner, e fez política partidária junto com Capinam, Gonzaguinha, Fábio Paes e Jorge Portugal. Gravou três CDs, e suas músicas foram interpretadas por artistas de várias gerações. Atualmente, sobrevive apenas de música e é integrante do Assentamento Eldorado (“Pitinga”), do MST, em Santo Amaro, onde é muito querido pela comunidade.
A conversa que se segue, sintetizada aqui nos trechos mais significativos, ocorreu na Secretaria do MST, em Salvador, entre risadas e goles de cervejas ingeridas pelo entrevistado, que traçou um rico painel da sua trajetória de vida e musical. Das mágoas com setores de esquerda aos sonhos de contribuir com a luta do MST, além de suas composições e das pinturas ao lado da sua companheira, que promove aulas de artesanato no assentamento em que reside e comercializa produtos.
Para iniciar, fale de sua experiência no campo. Você plantou num sítio no sertão de Piritiba, pegando na enxada como pega um catingueiro, como conta na música “Capim-Guiné”?
Wilson Aragão – (Risos!...) Trabalhei muito com meu pai, na foice. Ele era um bom pedreiro, construiu dez casinhas simples de adobe, depois vendeu e comprou um sítio no sertão de Piritiba. Mais tarde, compraria o outro lado da estrada. Enquanto capinava, abrindo as covas, eu ia jogando as sementes e tapando as 70 ou 80 tarefas de feijão, milho, banana, aipim, mandioca, caju, jaca, entre outras culturas. Catei muita mamona e puxei carro de boi para pegar madeira da floresta. Lembro que na roça ele tinha um rádio de seis faixas, e quando a gente estava trabalhando ele aumentava o volume pra gente escutar a música, numa distância de 50 a 100 metros. Gostava de ouvir Luiz Gonzaga, Nelson Gonçalves, Carlos Nobre e Jackson do Pandeiro. E assim passei a infância e a adolescência, recebendo todas essas influências.
E lá pras bandas de Piritiba, Morro do Chapéu e Mira Serra, havia virtuosos violeiros? Sempre surgia novidade na feira; homens vindos da Paraíba, foragidos da seca, procurando emprego nas roças, que traziam a cultura de lá. Eu achava muito bonito o pessoal batendo pandeiro e dizendo versos. Lá em Mira Serra tinha até um sujeito que fazia um som maravilhoso, uma mistura de cavaquinho com viola, extraído de um instrumento inventado por ele, num formato de lata de óleo, com cordas de arame de estender roupa.
Aprendeu a tocar lá instrumentos; o violão, por exemplo?
Eu ficava cutucando, mas vim aprender a tocar um pouquinho de violão já depois de casado. Minha vida toda foi no Evangelho, minha família sempre foi prebisteriana, era igreja quarta, sexta, domingo. Meu pai dizia que violão era coisa de vagabundo, e não deixava aproximar do violão. Eu disse que quando fosse dono do meu nariz, compraria um violão. E realmente, quando meu pai separou de minha mãe e eu fui pra São Paulo trabalhar, comprei um violão.
Era uma época de euforia, da ideologia “Brasil, potência do mundo”; da conquista do tricampeonato mundial de futebol; da proliferação das torturas nos porões da ditadura; e da pornochanchada nas telas do cinema brasileiro. Os militares estavam no auge da sua popularidade, por conta do chamado “Milagre Econômico”: “ninguém segura esse país”, “ame ou deixe-o”...
Eu morava em Piritiba já pleiteando algum emprego, mas toda a minha família era de oposição. Os políticos de direita da cidade eram da ARENA e não deixaram que eu trabalhasse na prefeitura, nem no Banco da Bahia. Sem opção de trabalho formal, só me restou ganhar algum dinheiro como artista, fazendo desenhos e pintura. A prefeitura era obrigada a me engolir porque eu produzia todas suas faixas.
Desenhava ainda escudos do colégio etc. Na 1º Exposição de Arte da cidade, conquistei três prêmios, inclusive o 1º lugar de desenho, imaginação e pintura. Cantava ainda no coral e nos muitos grupos que formávamos, como o grupo musical “Os Helps”, que tinha muita influência dos Beatles, e depois virou “Os Horríveis” (risos...).
Você percebeu que a cidade era pequena para suas inquietações...
No dia em que fui pra São Paulo, minha mãe correu atrás do ônibus, tropeçou e caiu no meio da rua. Na metrópole, meu tio me deu abrigo por um ano, aí dividimos um quartinho, eu e um amigo. Mais tarde, fui promovido na fábrica Companhia Brasileira de Alumínio, na cidade de Mairinque, onde eu também morava, e, pra estudar Pedagogia na Universidade de Sorocaba, eu tinha que viajar diariamente 60 a 70 km de distância. Passei a admirar um professor comunista chamado Álvaro Vanucchi, que foi preso na ditadura militar, expulso do Brasil e depois voltou. O sobrinho dele era estudante de medicina e foi morto numa praça em São Paulo, em plena luz do dia. Eu fui assimilando estas histórias e tomando conhecimento do que era a ditadura militar. Quando bateu a saudade, eu vim me embora, em 1978, com greves estourando em tudo que é canto. Como eu era especialista em Recursos Humanos, as empresas se interessaram por mim. Comecei a trabalhar no Pólo Petroquímico ganhando 21 salários mínimos, um dinheirão pra época. Montava planos de cargos e salários, convênios e assistência médica. Quando me chamavam para tocar em algum lugar, eu dispensava cachê. Ah, se eu soubesse que esse tempo ia passar...
Parece que a sua composição de maior sucesso, “Capim-Guiné”, foi feita neste período. Fale um pouco sobre a música.
Em 1979, nas horas vagas do trabalho, compus “Capim-Guiné”, que é um protesto contra a grilagem de terras na ditadura militar. Ocorreu que um fazendeiro de Tapiramutá, cheio de pistoleiros, invadiu de madrugada a propriedade de meu pai, que era evangélico e não tinha armas. No outro dia, meu pai foi à delegacia prestar queixa e o delegado não gostou. Seguiu então para Salvador, a fi m de conversar com o governador. Houve um telegrama do gabinete do governador perguntando quem era o meu pai. Quando souberam que se tratava de um homem de oposição, do MDB, disseram: “pode invadir as terras”. O fazendeiro cortava o arame e botava o gado para comer a nossa plantação. Nós emendávamos e ele novamente cortava. Meu pai foi a Brasília conversar com o presidente Geisel, e este também enviou uma mensagem. Quando foi informado de que a família era de oposição, disse que não podia fazer nada.
Ouvindo hoje “Capim-Guiné”, tem-se a impressão que há na letra algumas metáforas para ludibriar a censura.
Há sim, mas nessa época era proibido falar palavrão, e a música não passou na censura. Veio uma carta para todas as emissoras de rádio proibindo tocar “Capim- Guiné”. É bom esclarecer que a cara de veado à qual me referi era o presidente Geisel, pois qualquer barulhinho para o veado, ele pára, escuta atentamente, mas não toma atitude. Já o Caxinguelê é um esquilo brasileiro. Quanto a “não planto capim-guiné pra boi abanar rabo”, é porque eu não iria mais fazer roça pra bandido vir e tomar, desfrutando de tudo...
Esclareça a dúvida que paira entre os ouvintes de MPB: “Capim-Guiné” é apenas sua ou tem parceria com Raul Seixas? Como foi mesmo que você conheceu Raul?
Em 1982, em Piritiba, eu já havia conquistado um festival de música com “Capim- guiné”, antes de conhecer Raul. Na época, Elba Ramalho estava surgindo com muito sucesso, e eu fi cava sentado na porta dos hotéis esperando ela acordar. Aí, eu perguntava: “Gostou de Capim- Guiné?”, ela respondia: “Ouvi a fi ta e gostei de todas suas músicas, mas me dá um tempo, porque meu disco já está cheio”. Continuei colado com Elba. Um dia, os músicos me falaram: “Elba ensaiou Capim-Guiné, e está de arrombar, mas o diretor de produção pediu pra tirar e gravar uma música do Gonzaguinha, “Casca do Ovo”, porque ninguém sabe quem é esse Aragão”. Aí fi quei chateado e tive um “pega pra capar” com ela. A gente era amigo e ficamos diferentes até hoje.
Um conterrâneo de Piritiba, chamado Beto, me convenceu oferecer a música a Raul Seixas e mandou-a pra São Paulo. Um dia, ligamos para ele do orelhão e ele falou que havia gostado, mas queria propor pequenas alterações. Em vez, por exemplo, da frase “comprei um sítio, plantei jabuticaba, dois pés de guabiraba” etc. elaborado por mim, ele propôs “plantei um sítio no sertão de piritiba...”, homenageando a minha cidade, e misturou guabiraba com as pindaíbas, que eram as cachaças que ele bebia, botou guataíba, que não existe, e gravou. 
No lançamento do disco, em 1983, no Esporte Clube Periperi, a nossa amizade foi se estreitando. Ficamos num hotel, na Barra, o dia todo na beira da piscina “comendo água”. Gostei muito dele, suas palavras tinham sentimento, um coração bom, um jeito meio ameninado e meio maluco. Passei dois dias na casa dele em São Paulo, e enquanto ele cheirava muito éter e lança-perfume, eu tomava minhas cervejas. Depois, ele veio pra minha casa em Salvador e fez uma verdadeira revolução no Engenho Velho de Brotas, pois saiu bebendo cachaça em tudo que era boteco, e todo mundo querendo conhecê-lo. Também demos um passeio pelo sul da Bahia, fomos em Ibirataia, Barra do Rocha e Ipiaú.
Sua música mais conhecida é “Capim-Guiné”, mas qual é a que você mais gosta?
Sou apaixonado por “Sertões e Sertões”, do primeiro disco. Fiz quando eu tava sofrendo porque tiraram o trem de ferro, a Leste Brasileira, de Piritiba: “Ó mira, mira bem para o resto da estrada de ferro. Quantos braços cravados, quantos dormentes para ouvir o trem na curva apitar, apitou pra nunca mais”. Eu estava em São Paulo quando minha mãe me escreveu uma carta. Cheguei em casa e chorei.
E as feridas da vida?
Eu tenho uma mágoa danada. A gente que é de esquerda sempre foi boicotado. Quando a esquerda conquistou o poder, não abriu espaço para a nossa arte. As prefeituras do PT aqui da Bahia quase nenhuma me contrata. Só querem Calypso e Calcinha Preta, que deseduca a população. É a indústria da anti-cultura. Esse povo nunca foi forró. A cultura brasileira sempre foi voltada para os mesmos, se concentrando em torno dos poderosos. A Rádio Educadora aí tem dias que tocam dez músicas do Caetano, oito do Djavan, e nenhuma dos outros. Por que não divide o espaço? Convidam a gente para participar de reunião, de discussão, mas na hora de contratar e pagar o cachê, continuam os mesmos.
A gente tem que valorizar aquela coisa de raiz, Bule-bule, repentistas, samba de roda... Na região de Cachoeira e Santo Amaro tem grandes sambistas. No nosso assentamento, Eldorado, tem Luizinho, Delis e Rebeca, uma menininha de 4 anos.
As emissoras de rádio massacram os ouvidos, pegam qualquer besteira, pagam jabá pra tocar 50 vezes por dia e sonegam direitos autorais. Tem algumas que nem pagam porque alegam que a rádio dá prejuízo. Se dá prejuízo, porque não passa pra gente do MST? Cantei muito, sem cobrar cachê, para o Sindicato dos Bancários, da Construção Civil, dos Metalúrgicos e Eletricitários. Hoje, estão fortalecidos e não lembram da gente. Eu colocava minha música a serviço das lutas sindicais, e hoje esquecem que a gente sobrevive dos cachês. 
Quem é
Wilson Aragão é compositor. Fez política partidária junto com Capinam, Gonzaguinha, Fábio Paes e Jorge Portugal. Suas músicas foram gravadas por artistas de várias gerações. Possui três CD’s gravados
Letra de Capim-Guiné
Plantei um sítio no sertão de Piritiba dois pés de pidaiba, caju, manga e cajá peguei na enxada como pega o catingueiro fi z acervo, botei fogo, só vê como é que tá Tem abacate, jenipapo, bananeira, milho verde, macaxeira cuma diz no Ceará cebola, cuentro, angu, feijão de corda muito porco na engorda, muita vaca no currá com muita raça fi z tudo aqui sozinho nem um é de passarinho vei a terra semear agora, veja cumpadre, a safadesa começou a marvadesa, todo bocho vem prá cá num planto capim-guiné pra boi abaná rabo tô virado no diabo, tô retado com você tá vendo tudo e fica aí parado com cara de veado que viu caxinguelê suçuarana só fez perversidade pardal foi pra cidade piruá minha saqué dona raposa só vive na mardade me faça a caridade, se vire e dê no pé sagui trepado no pé da goiabeira sariguê na macaxeira, tem inté tamanduá minhas galinha já num fi ca mais parada e os galos de madrugada tem medo de cantá num planto capim-guiné praboi abaná rabo tô virado no diabo, tô retado com você tá vendo tudo e fica aí parado com cara de veado que viu caxinguelê