2 de novembro de 2012

UM DIA DE NOURE NAS CALDAS DO CIPÓ



Hoje tive um dia, digamos, quase que totalmente cipoense. Seria de turista se minha ida a Cipó fosse pela Calçada, de trem até Alagoinhas, com hospedagem no Hotel Roma e nem sei se ainda existe e, de lá seguiria de uma marinetti. Pronto! Balancei a cabeça e deixei os anos 30 do século passado em seu devido lugar e ponto de congelamento de onde realmente o turismo se fez turismo em Cipó. Minha ida por lá seria genuinamente em dois caminhos, sendo, um bancário e outro familiar.

Há tempos que não viajava de ônibus e não é que o conforto é peça chave nos ônibus atuais. Melhor ainda e não por egoismo, que apenas três pessoas viajaram pelos 250 km com um grande ônibus todo à disposição e com bom silêncio que se rompia com a conversa em alto som da cobradora com o motorista, este dizendo que gostava mais de tanquinho e aquela, a cobradora, insistindo que fazia opção em lavadora e que é claro, no momento do esfregar, passar o sabão de pedra, era de fundamental importância a participação de suas mãos, dado que a ausência delas, seria como se permanecesse toda sujeira. Ainda acrescentou que a lavadora foi comprada, graças a sua inteligência de sempre fazer CAIXA e por ter tão felizarda iniciativa, os primeiros valores vão diretamente para ela e, assim, certeza de que serve para compras e consequentemente comprar a boa máquina. Eu que nem imaginava que ainda existia esse tipo de poupança coletiva. Então digamos que o dia começou bem, ouvindo falas alheias sobre caixa e, nada mais justo do que o motorista parar na Rua Rui Barbosa, fundo do Colégio Getúlio Vargas, que dá acesso ao Banco do Brasil de Cipó, Bahia.
E no Banco é como se eu observasse um resumo de todas as pessoas num só lugar. Até chegar ao setor de empréstimos...Uau! Passei pelo candidato a prefeito derrotado, do PT, Zé Roberto e, deu muitas justificativas em falas de que a vida segue e o mesmo vai seguindo com fé em Deus e nossa senhora. Na sequência, com olhar mais triste, vi ainda Gilson do Curral Novo, Aguimário e, mais à frente, uns outros mais alegres: o  Hugo, filho de Dege, eleito na base do bom sorriso e muito atencioso na direção do veículo que conduziu durante estes longos anos, professores e passageiros da saude. Outro alegre foi o Duda do Claudio Gordo. Encontrei o colega Heloisio, secretário de agricultura do município e presidente do PT e companheiro da executiva do partido já que também faço parte. Pude sentir em seu semblante um ar cansado e demasiado preocupado, bem diferente dos tempos que limitava-se aos pequenos projetos da pastoral da terra com meu amigo João Romão que, perguntado por ele, não se sabe o paradeiro. Todos estavam no banco, me parece, ajeitando a conta da vereança, dos negócios ou, ou e nem quero nem saber que não é de minha conta...Não sei. Encontrei Zé Walter, com sua pasta eterna em mãos na escuta de algum senhor que esteja na beira da aposentadoria e aí ele é mestre. Encontrei Franscisca, e, como sempre, com capacete no braço, bem orgulhosa que é pelos filhos doutores e sempre diz que fiz parte de tão boa ação, nos tempos de Iegs. Encontrei Jaime bancário que de banco em banco, ex-BANEB, colega de minha irmã Marize e agora BB, hei de se adivinhar que a aposentadoria vai ser pelo banco mesmo e não importa o qual. Os encontros são muitos e na base de tá mais gordo, tá mais magro, mais branco, mais queimado pelo sol, vai-se fazendo diálogos e perpetuando amizades. Encontrei Flávio Leone pelas ruas em frente ao Cine Leone e por ser 12:34 hs, nem desejava ir falar com Arildo Leone para não pensar que estaria desejando falar na rádio que aliás, sempre foi aberta à minha voz e o mesmo faz questão de dizer assim, todas às vezes que me ver ou me via. Mesmo assim, fui até lá, já que teria compromisso de retornar ainda hoje para Salvador e falei rapidamente. Cabeça baixa ele estava e cabeça baixa ficou. Mas, não tem nada não. N'outros tempos sempre me atendeu com a cabeça erguida e emocionava-se com cada palavra exposta. Talvez esteja chateado pela penúltima festa de Reis que tão bom comentário fez e não fui agradecer. Acho que não...Olha! Deixa pra lá. Arildo é a história das comunicações e hoje temos que elogiar sempre sem preocupações o seu trabalho diário que amedronta e alegra a qualquer um com a música repleta de toques de flautas chilenas e que já se tem anos com ótima vinheta. As desconfianças sumiram quando enxerguei num outro momento o verdadeiro Arildo alegre, triste e gozador, quando me parece, Branquinho, disse que os carcereiros presos ouviam bem todos os dias a rádio. carcereiros presos! Não são os presidiários? Corrigiu Arildo, como sempre a gente do lado de cá ouvindo as boas risadas dos bastidores por não ser comum fechar os microfones em algum momento e isso é bom por nos fazermos em interação com as gozações como se fosse um filme de terceira dimensão.

Nada mais natural do que visitar minha mãe e deitar no sofá. Já sei de cor. É como se chegasse um rei e assim me sinto em cada panela que levanto a tampa e cada vasilhame que vejo o que tem. Em questão de pouco tempo, o prato já se faz com uma boa carne de carneiro, feijão de corda e outros ingredientes do tempero de todas as mães e, como sempre, os da minha são melhores. Mal deito no sofá e Lene já olha dizendo que na rede é melhor, ou é pra não quebrar o sofá ou por carinho demasiado. Sandra já instala quase que automaticamente o ventilador em frente ao meu calor e, que calor fez no dia de hoje em Caldas do Cipó. Alex, o cunhado, sempre na disponibilidade do computador e Sandra diz logo que o bichinho tá estudando pela net. Que tratamento odara, numa linguagem bem usada no dia a dia de Cipó, resultado do chavão PRA CIPÓ FICAR ODARA  e do Grupo Odara, do qual me faz lembrar das maravilhas de todos e em especial Otoney.
Inclusive o dia de hoje, de todos os santos, é aniversário de minha irmã e pelo andar da carruagem, sabia que hoje teria uma festa, mesmo que pequena. Assim, disse a mãe que ia ali e voltava já. Mas, não! Fui em direção a Seu Neo e quando passo pela salgadeira, já é de costume. Chamo por três nomes em cada frente de casa: Dona Lia, tô passando. - Olha menino! É o Noure. Dona Adalgisa! Tô Passando. -Vá meu filho. E por penúltimo aceno para Dona Detinha que já se faz presente em sua porta para perguntar como vão as pessoas e em especial minha sogra Dona Madá, que hoje mora em Sátiro Dias e muito foi protagonista da Igreja Católica de Cipó.
Já quase na curva da Salgadeira, grito por Dona Chica já perguntando por seu Chico, o esposo. -Tá lá no fundo de Lando! Diz. E não é que estava. Em frente a seu Néo. Antes do ponto do ônibus, entre velhas geladeiras e dodges, aeroyles e outras rurais, vejo Lando na oficina que antes e bem antes mesmo era moradia de minha família e, eu pequeno ficava a contar quantos carros passavam, a partir do pequeno rol ao lado da casa. Eu tinha até medo de ficar ali antigamente. Dona Jacinta, boa vendedora de artesanato, quando passava, já corcunda, dizia que dentro de uma pedra que lá guardava a transmissão da Embasa, ficava um bicho de sete cabeças.

Pronto! Cheguei em Seu Néo e a pergunta de sempre a quem lá está no momento. - O Ônibus já passou?
Quem responde que não, é seu Chico e um outro amigo dele que se instalam por ali já para jogar dama, costume de mil, novecentos e antigamente, quando Elias da família dos Jajá era campeão.

De conversa em conversa, fui saudosista ao lembrar a seu Chico do tempo que ele vendia havaianas e, é tanto que ainda hoje, mesmo já aposentado para este fim, é chamado de Chico das Havaianas, das Alpecartas, do Chinelo e, por aí vai. É até comum se conciliar o nome de alguém a algum outro. Chica do Chico, Noure da Ermita, Ermita do Nivaldo, Nivaldo da Mariquinha, Mariquinha do Filete e, ufa! Cansei.

Seu Chico acrescentou que deixou de vender havaianas por causa de uns sergipanos que passaram a vender bem mais barato. O que eu achava interessante era o bolso dele cheio de dinheiro e ao final, cabia ao seu funcionário, eu, 0,00000001% do arrecadado e, graças a deus, dava para comprar tão boa bala em dona Marcolina. Ele ainda sorrindo disse: -olha menino! E você ainda lembra disso. Eu até coloquei que tinha muita inveja dele quando eu era menino e via o mesmo colocar todos os dias quatro, cinco ovos de uma só vez, bater, bater e bater e tomar com farinha aquela gemada. Quando eu chegava em casa, tentava de tudo para uma galinha poedeira oferecer tão bons ingredientes e...Nada! Continuou sorrindo e disse que não sabia o mal que estava causando em si próprio e hoje ainda sente os efeitos da loucura de tomar tantos ovos.

De conversa em conversa, olhava sempre para a chegada do ônibus. Na realidade, antes dele, quem chegou foi Tafossa, conhecido às vezes como Jorge da Embasa. Seu Chico ainda ensaiou algumas falas no sentido de dizer algo em quem ganhou a eleição. E disse, quando eu perguntei sobre os últimos acontecimentos. -Bem meu filho! Quem ganhou a eleição foi o neguinho Romildo. Gostei do adjetivo por ter boas relações com as comunidades quilombolas de Cipó, em especial da Várzea Grande e do Caboge, sendo a primeira, bem conhecida do neguinho Romildo, como bem observou seu Chico. Tomara que seja bom - disse ele e acrescentou: antes, todos fazem tudo e depois, neco de pitibiriba. Mas, é assim seu Chico. Os tempos são outros e exigem boa responsabilidade. Conversa de seu Chico sobre o neguinho frisado por ele passou, quando o mesmo gritou: vamos negão Tafossa...Jogue aí a dama. E não deu outra: o jogo da dama cobriu o espetáculo final e assim, já pude avistar o ônibus e ao mesmo tempo o bom coral dos presentes: UMA BOA VIAGEM!

Valeu!

Noure

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